Usei duas vezes hoje a palavra “deriva”, para dizer que estou fora de um ponto fixo, sem direção certa, no meio de um mar mental ou de gente na cidade.
Tudo é Tempo: os lugares são os mesmos, nós é quem passamos como o vento.
A localização é Tempo. A data, a hora, a ordem na fila. O carimbo “produto entregue”, as crianças brincando, os velhos esperando, os jovens flanando, o Sol se pondo por trás dos edifícios de diversas idades.
O café que esfria, a mensagem que não chega, a goteira que pinga no meio do pátio. O desenho que eu fiz e me aborreceu, mas me aborreceu porque fui impaciente, e desenhar é tempo de observar, registrar na mente, educar os sentidos e expor no papel. Desenhar as nuvens requer um tempo paciente mas ágil, já que elas vão devagar, mas muito rapidamente, se dissipando e tomando outra forma.
Tempo também é contar as janelinhas dos condomínios feios que em algum momento da História já estiveram na moda.
Tempo é som, e o silêncio que desembaralha as palavras através das vírgulas, pontos, reticências…
Tempo para anotar a data na página do caderno, com muita pressa para não perder a frase que se forma na cabeça. E a pressa causa garranchos, mas garranchos genuínos, garranchos ansiosos pela próxima ideia que de repente se materializará, feito surpresa para a própria autora. Autora essa que come o caminho das letras com os olhos, que sempre brincou de desenhar os tipos das revistas e tentava imitar gês (g) serifados e falhava miseravelmente, sem saber que teria ainda um dia diversas caligrafias, a tatuagem que a manda trabalhar (ora et labora), tantos cadernos — que se tornaram ou tornarão livros, diários — costurados por suas mãos trêmulas, trêmulas por ansiar o mundo mesmo sendo tão pequenas.
A mãe que grita “para” pede Tempo.
A atendente que chama “302” chama o Tempo.
O olhar direcionado para o teto requer Tempo.
Se arrumar para ir embora, pegar a bolsa, jogar o lixo, correr atrás do bebê, arrumar a cadeira, digerir, começar tudo de novo.
Eu disse no começo que estava à deriva, mas é mentira! Estou no Tempo, navegando a meu modo, porque o caminho que se escolhe é o caminho em que se está e o que se deixa levar.
Prefiro me perder numa aventura que pode ou não conferir perigos do que deitar inerte no chão, vendo o Tempo passar sem me levar embora.
Olá minha gente, tudo bem?
Faz muito tempo que não escrevo solto, e ontem (19.09) aconteceu. Não reescrevi nada porque não vi necessidade, e espero fazer mais textos como esse, para exercitar a escrita enferrujada. O Tempo é meu deus, todo mundo sabe. Ontem enxerguei ele direitinho em tudo que meus olhos “colocavam a mão”, e estou me deixando ser devorada por ele, como deve ser.
Pretendo deixar textos como esse para assinantes, ou com tempo limitado de leitura. Vamos ver, o Tempo dirá. Dia 28 sem falta teremos o 12º boletim do estúdio, considere esse texto como um presente de um ano!
Aproveito para aconselhar que você também escreva. Faz bem para a alma. E espero que escreva num dos cadernos costurados por mim ♥
Ler o que você escreve é um bom uso do Tempo. Obrigado Helinha, coisas vindas da alma são realmente um presente.