Olá, tudo bem?
Adianto que a newsletter de hoje ficou longa, então se você está lendo no e-mail, clique em open in app or online no canto superior direito desse texto, para ter acesso total.
Como disse em meu último story, “eu não quero mais saber de depressão opinião!”, então estou, com fé em mim mesma, disposta a utilizar as redes sociais agora somente para o que interessam: divulgar o meu trabalho. Quem quiser falar comigo pode mandar um e-mail ou responder a essa newsletter, quem tiver meu telefone, pode me dar um oi. Quero fingir que o mundo é pelo menos 15 anos mais novo, que os jovens são menos estúpidos e os velhos menos fascistas (e vice-versa). Nunca gostei de mentiras, as odeio. Mas os corvos e Saturno (que rege máscaras e atores de teatro na astrologia tradicional), mas primeiramente John Frusciante, Vivaldi, Ingmar Bergman, Peter Gabriel e Hermann Hesse me fizeram me interessar por máscaras, personas e atuações que temos que ter na vida, então vou fingir. Fingir é talvez uma ferramenta essencial para o artista; o mundo está cada dia mais pesado com esse ar denso e plúmbeo das ideias materialistas (nada contra, eu também sou), mas é leviano aquele que pensa que a realidade é só o mundo tangível e não como lemos e imaginamos o mundo. A oficina de colagem com a Maria Diel e As Cidades Invisíveis, mais alguns contos do Franz Kafka reacenderam isso em mim: nós precisamos de metáforas, onomatopeias, realidades mágicas, fábulas, emblemas e eu preciso sentir a vida com simbolismos e não o puro e simples “as coisas são como são, a realidade é de tal e tal forma, vamos cancelar isso e aquilo, ‘precisamos’ falar sobre tal coisa, problematizar a e não romantizar b”, como encaixotam e embolham os chatíssimos jovens, que não entendem nada do que estão falando e têm como pensadores não os milhares de filósofos desses milênios que temos de filosofia, mas o obvious.cc ou qualquer página bonitinha do instagram. A vida não é bonitinha. A vida não é -inha. Chega de mediocridade, todo dia preciso acordar e inventar para mim um mundo minimamente decente pra viver, porque se for concordar com esses acordos sociais parcos, rasos, anti-históricos de hoje em dia, não será possível sobreviver. As redes sociais são como bares lotados, e é muito otário pra pouco bar e pouca bebida pra aguentar tanta otarice.
Mas vamos às indicações, pois isso daqui não é um diário!
LENDO, VENDO & OUVINDO
LENDO 📚
BEVILACQUA; SILVA. África em artes. Download gratuito do livro promovido pelo Museu Afro Brasil.
CRUZ, Stéffani. Breves memórias da bibliofilia. O livro Philobiblon me foi apresentado pelo Lucas na Etec de Biblioteconomia, o segundo melhor curso que já fiz na minha vida, e esse texto sobre a obra é muito bonito.
KAFKA, Franz. Essencial Franz Kafka. Ganhei este de presente de amiga secreta do
no último natal. Não lia este um dos meus autores favoritos há quase dez anos, é tão bom voltar pra casa!RAMOS, Graciliano. O antimodernista: Graciliano Ramos e 1922. Org. Thiago Salla e Ieda Lebensztayn. Nem saí da apresentação ainda e estou chocada como temos reações semelhantes a esse movimento. Acho que vai virar um texto quando eu terminar de ler, pois eu posso dizer as mesmas coisas sobre as artes e ciências humanas e pensamento político da contemporaneidade.
Tenho lido muitas outras coisas que vou comentar aos poucos, me siga no goodreads.
Os modernistas brasileiros, confundindo o ambiente literário do país com a Academia, traçaram linhas divisórias rígidas (mas arbitrárias) entre o bom e o mau. E, querendo destruir tudo que ficara para trás, condenaram, por ignorância ou safadeza, muita coisa que merecia ser salva.
— Graciliano Ramos
♥ Quando perguntado se era um modernista, repudiou tal rótulo dizendo que “enquanto os rapazes de 1922 promoviam seu ‘movimentozinho’, ele se achava em Palmeira dos Índios, “em pleno sertão alagoano, vendendo chita no balcão”. ♥
VENDO 📺
La Double Vie de Véronique é um dos meus filmes favoritos, assim como sua trilha sonora. Reassisti após cinco anos, e amei muito mais. Se eu pudesse pintar o mundo, ele só teria as cores desse filme. Não tem muito o que dizer: o silêncio é a coisa mais bonita que existe. Em determinada cena, o pai cita Chagall, e acredito que seja o mesmo Marc Chagall que conheci este mês. As coisas se costuram de uma forma impressionante. Alexandre também é uma figura — e um nome — importante para mim.
Redes sociais para artistas é uma aula feita por meu amigo Jorge Ferreira com apoio do PROAC, que ensina como usar Instagram, com estratégias e planejamento, especialmente para artistas e grupos de teatro (ele é jornalista, social media e ator), mas que pode ser muito útil para todos nós que usamos as redes sociais a trabalho.
Slasher com pipoca é uma lista que fiz dos filmes que ando revendo, um tipo muito específico que me fez gostar de comer pipoca há poucos anos: aquela moda de meados dos anos 90, com os atores de calça baixa, muito gel, gloss, tamanco, top de tricot e cardigan gigante, mas com o toque especial dos machados, ganchos, facas e outros metais cortantes. Sou obcecada por Pânico há anos, mas rever Eu sei o que vocês fizeram no verão passado e Lenda Urbana me fez perceber que existe sim um pedacinho dos anos 1990 que eu consigo minimamente gostar e até sentir nostalgia.
OUVINDO 🎧
. I : e : I I . são os mais novos álbuns de John Frusciante, um homem a quem devo 70% das minhas referências musicais, no mínimo. Mas meus discos favoritos mesmo são os clássicos que transformei em minha trilogia: Niandra Lades and Usually Just a T-Shirt, Smile from the streets you hold e The Empyrean, que tenho revisitado nos últimos tempos. É meu ninho.
Genesis Live at Shepperton Studios, de 1973, é uma obra-prima visual dessa banda maravilhosa de rock progressivo. Phill Collins arrebenta no continuar da banda (e foi um imprescindível coautor de Nursery Cryme, meu disco favorito), mas a atmosfera que só Peter Gabriel tem é de outro mundo. Nunca me esqueço de ver, no Top Top MTV, a Marina Person e o Leo Madeira apresentando I Know what I like (in your wardrobe), bem no momento em que Peter imita um jardineiro com cortador de grama. “Se ser ator é manifestar Saturno, representar o Coringa é encarná-lo momentaneamente na Terra.” — disse o astrólogo
, e eu parafraseio com Se ser ator é manifestar Saturno, Peter Gabriel com suas maquiagens, movimentos e personagens o encarna momentaneamente na Terra. Se Saturno for mesmo meu Senhor da Natividade, então faz sentido eu não só querer comer as gravuras que vou apresentar adiante, como também gostaria de devorar esse azul, esses olhos, essa silhueta e essa aura benjaminiana que Peter incorpora nos palcos. Genesis sem Peter Gabriel entrou na era de sua reprodutibilidade técnica, e é uma excelente banda. Mas Genesis com Peter Gabriel possui, aura, possui história, possui fábula, pois é fabulosa.
La Double Vie de Véronique de Zbigniew Preisner é imprescindível. Impossível não indicar junto com o filme. Talvez o ultrapasse.
Pavulagem é um podcast indicado pela minha amiga
, e lembra o Catalendas, as histórias que meu pai conta, e todo o meu interesse mais genuíno por História, que vem na verdade de causos que as pessoas contam debaixo de uma lâmpada amarela (ou em frente a uma fogueira), enquanto bebem e descansam. Infelizmente é um programa muito curto para tão maravilhosas entidades originárias desse Brasil: os nossos deuses americanos.
INDO 🚶🏻♀️
Marc Chagall: sonho de amor é a mais nova exposição do CCBB-SP. Eu sempre amei os russos de graça, mas Marc Chagall foi a pedra fundamental para eu estabelecer esse conceito na minha cabeça. Um oceano de gravuras coloridas à mão — à mão —, muitas aves, muitas fábulas, e o interesse na tradição e na cultura popular. Marc Chagall, além de russo e gravador, é canceriano e faz aniversário um dia depois de mim (e muitos anos antes). Era um homem belíssimo, apaixonadíssimo, um poeta, e eu não esqueço as linhas das gravuras das Fábulas de La Fontaine, eu poderia comer aquelas linhazinhas… Se você não é de São Paulo ou Belo Horizonte, é possível que ainda chegue no Rio de Janeiro e Brasília, não sei a ordem, mas as duas primeiras cidades já receberam esse amor todo. Se você não mora onde tem CCBB, baixe o catálogo virtual gratuitamente e conheça esse homem de belos olhos, palavras, linhas e cores.
O ESTÚDIO 🦅
Estou reformando o site com certo sucesso, tendo ideias para cadernos novos, mais ousados (finalmente!), colagens analógicas, desenhos. Parece que estou perdendo o medo de enfrentar o papel — eu, que escrevo, desenho e encaderno tanto (não tanto quanto gostaria), honrando desde sempre o mais alto casa de ferreiro, espeto de pau, ou o CRAS —resolvi me voltar à matéria (não ao materialismo, há diferença) e botar a mão na massa. Em breve haverá novidade na loja, mesmo que singela. No blog do estúdio também. Enquanto isso, apreciem a Galeria São Jerônimo, um museu virtual de obras em domínio público retratando o meu xará, que estou fazendo curadoria baseada apenas em dois preceitos: me agradar visualmente e não ter direitos autorais que me comprometam judicialmente.
Resolvi abrir a opção paga da newsletter. Por enquanto sem retorno a vocês, apenas contribuição para quem se interessar e puder. Quando eu estiver mais organizada no tempo e no espaço, posso começar a fazer textos exclusivos ou mimos para assinantes. Vamos ver. O Tempo dirá.
Como sempre, perfeito. Toda vez que leio sua newsletter eu quero anotar frases no meu caderno. Ela está grande(?), mas li voando. Lindo, Helinha ❤️